31 de maio de 2011

Amor versus individualidade



Ao longo do segundo ano de vida a criança vivencia enorme avanço em suas competências: aprende a andar, a formular as primeiras frases, aprimora suas aptidões motoras etc. Se até então seu maior prazer era ficar no colo da mãe, usufruindo da paz e aconchego similar ao que foi perdido com o nascimento e sentindo por ela aquilo que chamamos de amor, agora ela gosta também de circular, especular sobre o ambiente, tentar entender para que servem e como é que funcionam os objetos. Coloca quase tudo que encontra na boca, tenta sentir seu tato, observa o que acontece quando deixa que caiam no chão. Dá sinais de grande satisfação a cada nova descoberta. Está praticando os primeiros atos próprios de sua individualidade - e se deleitando com eles.

Tudo isso acontece na presença da mãe. Sim, porque se ela for para um outro local, a criança imediatamente abandona o que está fazendo e sai em disparada atrás dela. O mesmo acontece se levar um tombo: corre chorando de volta para o colo. Diante da dor física ou da iminência de distanciamento exagerado da mãe, a sensação de desamparo cresce muito rapidamente e aí se torna absolutamente necessária a reaproximação. Há, pois, uma clara alternância de preferências: estando tudo em ordem, o que a criança quer é exercer os prazeres da sua individualidade em formação; ao menor desconforto, busca no aconchego materno (amor) o remédio para todas as dores.

Não há como não compararmos nossos comportamentos ditos adultos com o que acabei de descrever: queremos exercer nossa individualidade com a máxima liberdade, mas queremos voltar para casa e encontrar o parceiro à nossa espera. Ficamos bem longe da pessoa amada por algum tempo, mas depois o desejo maior é o de nos aconchegarmos; se isso não é possível, sentimos a dor forte correspondente à saudade (mistura de abandono com lembrança do calor que advém da companhia). Temos a nosso favor o benefício de um imaginário mais rico e a capacidade de nos comunicar com o amado à distância graças aos recursos tecnológicos: sentimos-nos aconchegados, mesmo longe, graças às palavras e juras de amor.

No convívio íntimo, parece que queremos mesmo é encontrar uma fórmula capaz de conciliar amor e individualidade: quero, por exemplo, assistir ao programa de TV do meu interesse e quero que minha amada esteja ao meu lado, se possível bem agarradinha. Ela, também interessada no aconchego, poderá tentar achar graça, por exemplo, no jogo de futebol que tanto me encanta. Mas talvez não consiga e aí começam os problemas. Ela se afastará, indo em busca daqueles que são os seus reais interesses individuais. Eu me sentirei rejeitado, abandonado e mal amado; tentarei pressioná-la com o intuito de fazer com que volte. Ela, prejudicada em seus legítimos direitos, irá se revoltar e a briga (chamada de briga normal dos casais) será inevitável.

O homem é, ao mesmo tempo, a criança e a mãe. O mesmo vale para a mulher. Querem exercer sua individualidade, mas sem se afastar muito um do outro. Lutarão pelo poder, para definir quem irá impor o ritmo e a programação. Por maiores que sejam as afinidades, sempre irão existir atividades que são do interesse exclusivo de um dos membros do casal. A fórmula tradicional - homens mandam e mulheres obedecem - não funciona mais (felizmente).

O que fazer? Só há um jeito: o crescimento emocional de ambos para que a dependência típica do amor infantil se atenue. Que cada um consiga se sentir em condições de exercer suas atividades, de modo a liberar o parceiro para fazer o mesmo.



Flavio Gikovate 

22 comentários:

Eva disse...

Oi Lena que maravilha esse texto do Gikovate, eu adorei,tão difícil a convivência, os limites entre a dedicação e o respeito, quanto mais livres e inspirados um no outro, mais flui, dificil ter essa segurança para liberar, o segredinho é obter dia a dia mais e mais segurança na gente mesmo e isso transborda em respeito e amor puro. Vamos treinando... beijinhos, um dia super bom para vc.

mfc disse...

Só através do crescimento cultural conseguiremos atingir esse estádio de equilíbrio que permita o diálogo criativo entre os dois.

Meire Oliveira disse...

Lena, estrelinha querida, vc mais uma vez postando algo que dá pano pra manga. Eu acho super saudável casais que conseguem fazer coisas separadamente, pois há alguns que tem a necessidade de viver grudado e uma hora isso não acaba bem. Temos que conseguir ter nossa individualidade em qualquer tipo de relação!

Que hj seja um dia lindo pra ti, que o sol ilumine sua vida. Adoro vc, bjo grande com mega carinho.

Hellen Caroline disse...

Lena,
O que é quase impossível hoje em dia,num mundo onde pessoas egoístas enxergam apenas seu nariz e mesmo assim acha que o outro tem de cooperar com inúmeras atitudes,e talvez seja por isso que relacionamentos não duram,por um não aceitar as diferenças de idéias do outro,talvez seja por isso que o amor esteja extinto...
Que essa individualidade se faça presente,precisamos disso em todos os aspectos!
Beijo enorme pra ti,Amada!

MISSIONÁRIA DIANA disse...

linda a comparação que você fez, o amor de uma criança por sua mãe ao amor de um homem e uma mulher, interessante mesmo o texto. estava com saudades daqui.

Anônimo disse...

Oi Leninha!
Uma escapadinha rápida no intervalo para dar um alô...
Bjs e boa semana!!

Marluce disse...

Linda mensagem, muitas vezes nos tornamos tão dependentes do outro que passamos a viver apenas as particularidades do companheiro, e esquecemos de nossa própria história.

Ale disse...

Lena,

E requer muito esforço esse aprendizado,

De ambos os lados,

Um beijo

Marluce disse...

Linda mensagem, as vezes vivenciamos tanto as particularidades do outro que esquecemos da nossa própria historia.

Bjs Te Adolo!

Vera Lúcia disse...

Pura verdade.
Queremos estar perto e fazendo o que interessa. Impossível, a menos que um abdique de seus interesses para satisfazer o outro.
Isto não existe mais.
A individualidade há de ser respeitada, o que não invalida o aconchego.
As vezes estou no computador e meu marido no quarto, assistindo aos programas de seu interesse. Ele passa a todo momento por mim, trazendo uma laranja descascada , uma pipoca ou outro mimo. E , por
minha vez, vou à porta do quarto vez ou outra perguntar se o programa está bom, se ele já está com sono e assim por diante. Eu estou fazendo o que quero e ele também, e estamos aconchegados. Simples assim.
Beijo.

PRECIOSA disse...

Olá Lena, fiquei muito feliz com sua visita, e o amavel comentário
Bom demais ter amigos
Já sigo seu outro blog
Beijos
Preciosa Maria

Calu Barros disse...

È Leninha, a fórmula mágica da equidade conjugal. Sempre buscada, nem sempre alcançada.Sorte que temos sabido de mais acertos que erros neste campo, pois, já há bom tempo que a maioria dos casais bem entrosados se harmoniza para conjugar seus interesses individuais sem prejuízo para o relacionamento afetivo.
Mas é sempre bom o alerta ficar aceso e conforme diz Gikovate,amadurecer os sentimentos e o respeito ao ser de cada um.
Compreensão e cooperação são palavras precisas.
Lindo dia p/ vc.
Bjinhos,
Calu

Anônimo disse...

Sempre com textos extraordinários!.. Realmente só mesmo com o amadurecimento de ambos é que serão capazes de ter uma saudável e tranquila convivência.

Beijoquinhas super em seu coração Lena!

Verinha

Vinicius.C disse...

Olá !!

Perfeito seu texto!!

Eu vivo uma relação átipica.

Minha namorada mora em São Paulo e eu no Rio De Janeiro.

Mesmo que nosso contato seja a maior parte do tempo pelo computador, só muda o formado porq tudo é igual.

Respeitando um silêncio, uma atividade, um tempo fora ou off.. rs

Nos vemos pouco o que torna essa relação um tanto mais delicada.

Enfim... adorei seu texto!

Um beijo enorme!
Espero por vc no Alma!

Renata Marengo disse...

Oi Lena! Adorei o texto! E quero desejar uma ótima semana!
Beijos Renata

Catia Bosso disse...

Eita liberdade dificil, Meu Deus!!!

Mas se é o caminho, que seja!!!

Crescendo e amando!
Amando e vivendo!
Vivendo e aprendendo!

bjss

Em tempo...eu era seguidora do Alem das nuvens e nao estava mais lá, sera que foi de qdo deu pana no blogger? Segui novamente pra garantir...

MA FERREIRA disse...

Oi Lena..hoje cheguei atrasada!!
Bacana esta postagem.
Casamento não é facil. No inicio udo é bonitinho. Cedemos aqui, cedemos ali...Acredito que nós mulheres cedemos mais.
Com o passar do tempo.. começam-se as exigencia e as cobranças.
O que era engraçadinho, começa a te incomodar.. e ai..o que fazer.....
Acredito que seja deixar a ilusão de lado, de que principe não existe, muito menos princesa, e aceitar o outro como ele é.
Se quisermos alguma mudança, esta terá que partir de nós, porque o outro só muda quando nós mudamos.
Depois que eu mudei..com terapia, com a ida ao Brahma Kumaris, com a minha relação com a ceramica, enfim..
quando passei a cobrar menos..as coisas melhorarm e muito.
Um beijo minha querida Lena!!
Bons sonhos!!
MA

Artes e escritas disse...

Lena,imagino o quanto você ajuda o próximo com os seus textos que levam ao autoconhecimento. Yayá.

Débora Andrade disse...

Uma coisa é amar, e outra, é saber amar. Há quem ame e não sabe amar, há quem sabe amar e não ame. Há quem ame e sabe amar e há também aquele que nem ama e nem sabe amar. Quem ama e não sabe amar é aquele que diz que ama, mas com atitudes não consegue demonstrar muito bem. Aquele que algumas vezes permite que outras coisas intervenham no seu sentimento, mas isso é problema na personalidade, algumas vezes, e não sentimento. Aqueles outros que sabem amar e não amam, sabem porque um dia amaram, mas isso passou, e hoje não amam mais, às vezes por vontade própria, por fecharem-se espontaneamente. Há aqueles que amam e sabem amar, procuram fazer de tudo para o amor fluir, erram, claro, todos erramos, mas não deixam que os erros enfraqueçam o amor, sabem (re)conquistar a cada dia. Já aqueles que não amam e nem sabem amar, são aqueles que ainda não desfrutaram desse maravilhoso sentimento. Quem sabe amar deixa livre, porque há horas em que temos que abrir mão, então, devemos escolher: Ou abrimos mão do amor, ou abrimos mão do medo, da insegurança, do individualismo. Há quem escolha a si, há quem escolha tudo, menos o amor, depois vem o arrependimento. Há quem finja que o arrependimento não veio. Mas como disse Tom Jobim: "É impossível ser feliz sozinho". E desfrutar da liberdade sozinho, aprisiona. Ficamos reféns da solidão, da saudade, reféns de nós mesmos, das nossas dores e amarguras. Desfrutar da liberdade ao lado de quem amamos, isso sim, liberta!

Beijos linda Lena,
Débora.

♪ Sil disse...

Lena,

Eu penso que isso tudo contribua para que cada vez mais os relacionamentos sejam curtos demais.
Saber libertar o outro, para que ele cresça independente de nós, é um aprendizado árduo, mas ao mesmo tempo tão fácil.
Tem que soltar as amarras!

Eu sou fã do Flávio Gikovate.

Um beijo minha amiga amadaaaaaa!

Milene R. F. S. disse...

E como é difícil essa liberdade quando estamos muito envolvidos! Há que se negociar muito, tolerar, ser paciênte, e fazer concessões mútuas, para que as duas pessoas envolvidas em um relacionamento muito íntimo não saiam ou sufocadas ou se sentindo abandonadas pelo outro... complicado como quase tudo que diz respeito a relacionamentos. Gosto de ficar junto, mas não gosto de me sentir sufocada e entre essas duas coisas existe uma linha bem tênue... Beijos querida e até.

Tatiana Kielberman disse...

E que nos seja sempre possível viver e sentir o amor...

Beijos, queridíssima!

Um prazer passar por aqui!!