7 de dezembro de 2010

O casamento que mata aos poucos



Não consigo tirar da cabeça um estudo de psicologia divulgado há pouco nos Estados Unidos. Ele demonstra como um casamento infeliz é capaz de destruir a saúde do coração.

Talvez por isso eu tenha ficado tão interessada na pesquisa realizada pela psicóloga Nancy Henry, da Universidade de Utah. Ela recrutou 276 casais com idades entre 40 e 70 anos. Eram uniões duradouras, de 20 anos, em média. Nancy investigou a qualidade desses casamentos analisando suporte mútuo, envolvimento emocional e frequência de desentendimentos sobre sexo, filhos e dinheiro. Os participantes passaram por avaliações médicas como exames de sangue, medidas da pressão arterial e da circunferência da cintura.

Nancy descobriu que uniões desgastadas podem provocar depressão nas mulheres e nos homens. Mas as mulheres que vivem casamentos infelizes parecem estar mais sujeitas a desenvolver sintomas fisiológicos da chamada síndrome metabólica. Ela é caracterizada por sinais como acúmulo de gordura abdominal, hipertensão, excesso de açúcar no sangue, baixos níveis de colesterol bom e excesso de triglicérides. Quem tem pelo menos três dessas  tem a tal síndrome metabólica. Ela aumenta o risco de infarto, AVC e diabetes.

Por que as mulheres sofrem mais? As mulheres parecem basear o conceito que elas têm de si mesmas na qualidade das relações que elas vivem. Talvez por isso um casamento ruim tenha um impacto tão grande na saúde física e emocional das mulheres.

Atualmente há vários estudos que associam a depressão com a síndrome metabólica. A maneira mais simplista de explicar a relação seria que a pessoa deprimida ou com forte stress psicológico abandona medidas saudáveis de estilo de vida. Fuma mais, não vê razão para fazer atividade física e come mal.

Existem também mecanismos metabólicos envolvidos nisso. O stress aumenta as descargas do hormônio cortisol. Essa substância contribui para o acúmulo de gordura abdominal, aumento da pressão arterial e da resistência à insulina (o que desencadeia o diabetes). Alguns estudos sugerem que as mulheres sejam mais sensíveis aos efeitos deletérios da depressão. Outros apontam a mesma coisa nos homens. A depressão é indiscutivelmente a doença do século. A manutenção de um relacionamento falido perpetua um ciclo de stress, diminuição da autoestima e falta de perspectivas.

Conheço bem de perto um casal que vive esse ciclo há quase 50 anos. Começou a se desentender na lua-de-mel e nunca mais encontrou o eixo do respeito mútuo. Vai completar bodas de ouro (ou será de sangue?). Esse homem e essa mulher nunca tiveram coragem de reconstruir a vida. O sofrimento não é só deles. A decisão de perpetuar um casamento desgastado teve uma grande repercussão na formação da personalidade das filhas. E hoje elas reduzem as possibilidades de convívio familiar oferecidas aos netos.

Eles se acostumaram a viver mal. A saúde de ambos anda mal. O homem, contido e calado, já sofreu um "quase" infarto. A mulher, explosiva e rancorosa, tem açúcar demais no sangue, colesterol alto e gordura abdominal. Os médicos tentam baixar os índices com remédios, mas a "questão de fundo" está além do alcance deles.

A infelicidade deveria ser tão combatida quanto o colesterol. Mas essa decisão só pode partir de quem sofre. Naquela relação não sei qual dos dois sofre mais. Nem qual dos dois é mais culpado.

Acho que um dia vou receber um telefonema de um dos meus pais dizendo que o outro morreu de repente. Uma morte rápida, instantânea, mas tramada ao longo de décadas de uma infeliz vida a dois. Mas quem sou eu para prever quem vai morrer antes de quem? Talvez um dia eles estejam vivos para receber um telefonema desse tipo. E a ligação pode partir da minha casa.

Cristiane Segatto
 

Um comentário:

orvalho do ceu disse...

Oi, Lena
Gostei muito desse post... do final mais ainda... é inocência pensarmos que só acontece no quintal vizinho...
Abraços fraternos e bjs de paz.