31 de agosto de 2012

Me apaixonei pelo meu amigo. E agora?




Vocês se conhecem há tempos, têm um relacionamento muito legal, confiam um no outro e até contam as aventuras amorosas que vivem, em seus mínimos detalhes. Consideram-se praticamente irmãos, saem sempre juntos, compartilham amigos, segredos e sonhos.

Um baita privilégio ter alguém assim por perto, com quem a gente se dá tão bem e, principalmente, com quem pode contar para o que der e vier! Amigo é mesmo "coisa para se guardar debaixo de sete chaves, dentro do coração...", como tão lindamente canta Milton Nascimento.

Porém, contudo, no entanto... num belo dia, sem que você esteja contando com isso, olha para essa pessoa e sente que ela está muito mais dentro do seu coração do que você imaginava. Tão dentro que o faz acelerar, bater descompassadamente. Tao forte que faz você suar frio!

Assustada, confusa, você se pergunta: o que é isso? O que está acontecendo comigo? Será que to ficando maluca? E de repente, "cai a ficha"! Sim, você está apaixonada pelo seu amigo! E a primeira e constante pergunta que se faz agora e pelos próximos intermináveis dias, é: e agora?

Bem, se a recíproca for verdadeira e os dois se derem conta de que a amizade está pedindo algo ainda mais íntimo e intenso, e se os dois estiverem solteiros e desimpedidos, então, não há o que se perguntar. Penso que é hora de conversarem sobre o que estão sentindo e, da forma mais sincera e espontânea possível, aceitarem esse convite para viver esse amor tão amigo, que pode mesmo ser pra lá de especial!

Mas, se o ritmo dessa relação mudou só para você; se seu amigo não dá indício nenhum de que o sentimento dele também está diferente, então, é mesmo prudente refletir a respeito. Se, por um lado, você pode tentar conquistá-lo, mostrando que já existe entre vocês um cenário bastante promissor, por outro, tudo isso pode significar um grande risco.

De todo modo, penso que problema mesmo existe quando um dos dois é comprometido e pretende continuar assim. Daí, para o caldo entornar e a amizade desandar é um perigo! Sem contar que é quase certo que conflito, frustração e dor vêm pela frente, seja porque um dos dois vai ter de se afastar, seja porque um dos dois não vai estar por inteiro na nova relação instaurada - e vai machucar o outro.

O fato é que, quando existem dois (ou mais) corações envolvidos de forma tão contundente, é preciso lançar mão de ferramentas internas como intuição, sensibilidade, ponderação, verdade (muita verdade!) e fé! Sim, fé para confiar na sabedoria da vida, para perceber que ela manda sinais, que ela mostra o melhor caminho. Mas precisamos estar atentos, confiantes e maduros para aceitar, seja o que for que se mostre como o mais razoável para todos.

Assim, se você se apaixonou pelo seu amigo, se sente que está numa situação delicada e corre o risco de perder algo que é tão caro para você, então, respire fundo, consulte seu coração, questione-se sobre o que realmente quer e, se sentir que é necessário, fique um tempo de longe, observando, tanto a si mesmo, como a relação e ao outro.

Se chegar à conclusão de que esse novo sentimento é forte demais para ser relevado, e que você quer arriscar, sugiro que você esteja convicto de que vai precisar falar sobre o que sente e, principalmente, ouvir. Ouvir o que seu amigo pensa, sente e quer diante de tudo o que você vai dizer. Depois, convide-o para uma conversa franca e deixe a voz do amor falar.

Aconteça o que acontecer, se os dois conseguirem se respeitar e, acima de tudo, valorizar tudo de bom que já viveram, o final dessa história - seja agora ou daqui há algum tempo - só poderá ser feliz! Só poderá servir para fazê-los crescer! É assim sempre quando duas pessoas enxergam além de si mesmos. Enxergam suas almas!


Rosana Braga

30 de agosto de 2012

Você tem medo da paixão?




A paixão é comparada ao fogo: intensa, forte, quente, envolvente e extremamente sedutora. Não manda aviso que está chegando nem pede licença para entrar em sua vida. Algumas pessoas temem a paixão pelo movimento de entrega que ela implica. Paixão é envolvimento, o apaixonado mistura-se ao outro e às próprias expectativas em relação ao outro.

Usamos o termo cegos de paixão, porque realmente esta dança parece algo cega, não enxergamos o outro como se houvesse entre nós uma cortina de fumaça composta por nossas ilusões, fantasias e desejos. Na paixão enxergamos apenas o que queremos ver, nossas necessidades, nossa completude.

Toda cegueira traz consigo a escuridão e a insegurança. O sentimento de segurança não se desenvolve a partir de nossos olhos, mas dentro de nós. O que nos protege contra o medo é nossa certeza de poder superá-lo. A paixão é uma forma de envolvimento emocional; o que possibilita o permitir-se apaixonar é a sensação de individualidade; quando sabemos quem somos e o que desejamos, a paixão chega como um movimento que acrescenta e nos transforma, mas, quando estamos perdidos dentro de nós, frágeis e imaturos, a paixão torna-se perigosa e viciante, nascem as relações doentias onde o outro passa a ser a parte que necessitamos insanamente.

A maturidade emocional traz segurança e parâmetro para nos lançarmos na paixão. Isto não significa medir o quanto se entregar, ou envolver-se de forma moderada tentando evitar um possível sofrimento, pelo contrário, significa ter internamente a certeza que existe um eu que está se apaixonando, capaz de se defender e que não desintegrará com uma frustração, sofrerá sim, caso se decepcione ou não for correspondido, mas certamente sairá renovado e fortalecido dessa experiência.

A paixão é um movimento intenso onde reina a emoção e onde a razão de nada ou pouco interfere. Como todos os movimentos humanos, pode ser positiva, à medida que possibilita crescimento e transformação, ou negativa à medida que torna o indivíduo alienado e dependente emocionalmente.

É comum as pessoas se apaixonarem por alguém que conhecem muito pouco, simplesmente, porque a paixão vem de outra esfera, a esfera da ilusão, tão necessária para nossa vida. Com o decorrer da relação, e ao passo que as pessoas vão se conhecendo melhor, suas qualidades e desejos, suas particularidades, ela vai naturalmente tomando novas formas podendo se transformar em amor, amizade, ternura ou - nas piores hipóteses - em relações doentias, onde reinam outros sentimentos como raiva, posse, inveja, mágoa e ressentimento.

Muitas vezes nos relacionamos buscando no outro o que não temos, ou o que pensamos que não temos. Nas relações patológicas o outro passa a desempenhar o papel ou a função na qual temos dificuldade. Por exemplo, se não sabemos nos defender, colocamos o outro como nosso defensor ao assumirmos a posição de vítimas, enquanto poderíamos usá-lo como modelo, aprendendo com ele a nos autoproteger, a sermos mais seguros e assertivos em nossos desejos e responsáveis por nossas atitudes.

O caminho que cada relação vai tomar dependerá da saúde emocional de cada um dos envolvidos. Devemos cuidar de nossa saúde emocional da mesma forma que cuidamos de nossa saúde física, pois ela interfere em todas as relações que fazemos, sejam pessoais ou profissionais e em nossa busca de viver de forma prazerosa e feliz.

Em síntese: paixão é vida, é arriscar, é ousar, é envolver-se, é sentir e não apenas pensar. Aprendemos com a experiência a avaliar a relação custo/benefício de nossos atos, mas também aprendemos que a vida não pode ser conduzida pelo medo, pois é preciosa demais para ser desperdiçada. Então, você ainda tem medo da paixão?
Sirley Bittú 

29 de agosto de 2012

Preconceitos resistem ao tempo




O vislumbrar de perspectivas otimistas para a condição humana - uma vida cheia de alegrias, gratificações, essencialmente derivada de relações humanas ricas e desinteressadas - costuma levar a maioria das pessoas para a busca apressada deste objetivo sem que levem a sério os obstáculos e dificuldades a serem ultrapassados. É como interpreto hoje os fatos acontecidos nos anos 60: de repente as pessoas pensaram - especialmente os jovens - que bastava mudar o tipo de roupa, modificar o corte dos cabelos, usar sandálias para que se fizesse a revolução psicológica e de costumes que já podia ser prenunciada. Acredito que aqueles que não se aperceberem da existência de uma longa caminhada, de um profundo mergulho em si mesmo, cairão de novo no abismo da desesperança, das drogas e do consumismo conservador (e não foi isso que se deu nos anos 70?).

Quando as experiências libertárias não dão certo, isto significa que somos capazes de gerar ideias com muita rapidez e facilidade, mas que em geral não temos estrutura interior para viver segundo elas. Forçamo-nos a isto, nos desequilibramos, caímos, nos machucamos e concluímos que as ideias estavam erradas; na verdade, acho que a conclusão deveria ser outra: ainda não estamos prontos e maduros para viver de outro modo, para nos soltarmos das amarras que nos limitam mas também que nos protegem, nos dão sensação de aconchego e segurança. Não se pode tentar atalho para se chegar mais depressa ao que se pretende; há que percorrer toda a trajetória, sofrida e cheia de desesperos para se atingir uma estabilidade íntima. Senão, mais uma vez chegaremos apenas ao falso brilhante, à imitação.

Assim, se nos fixarmos numa das questões mais essenciais da liberdade que é o do respeito pelo modo de ser e de pensar do outro, vemos que esta coisa extremamente simples e óbvia nunca chegou a existir como fato. E isto não apenas como postura das classes dominantes, conservadoras e que tentam preservar seus privilégios. Todos os grupos minoritários agem da mesma forma: se consideram donos da verdade, superiores; têm um desprezo visceral pelos que pensam de modo diferente e tratam de impor suas ideias tanto através das palavras como mesmo pela força. Grupos religiosos diferentes já fizeram longas e sangrentas guerras para fazerem prevalecer suas opiniões e verdades. Ideologias políticas também se exerceram desta forma. E, isto é o mais incrível, os jovens libertários dos anos 60 ostentavam enorme desprezo pelos caretas; quem não fosse iniciado nas luzes advindas do uso da maconha - e depois do LSD - era tão desprezado e desinteressante que nem mesmo valia a pena trocar algumas palavras.

Os ateus acham imbecis os que acreditam em Deus; os crentes têm pena dos ateus - e a pena é outra forma de manifestação de desprezo; é sentimento de cima para baixo, de rico para pobre. Os homossexuais sãos os entendidos e os heterossexuais são, para eles, meio primários; os heterossexuais acham a homossexualidade abominável, uma perversão. O limite desta prepotência permanente e assim grotesca constitui a essência dos preconceitos e do fanático nacionalismo. Assim, os negros são uma raça inferior, os judeus perigosos e avarentos, os argentinos grosseiros e mal-educados...

Aí a gente vai conversar individualmente com as pessoas e todos se consideram criaturas de mente aberta, cheias de bom senso e compreensão, capazes de se ater a novos conceitos, sempre dispostos a rever suas posições. Até parece uma brincadeira e seria engraçado se não fosse extremamente grave, pois no meio deste discurso liberal sempre aparecem frases como: isto eu não admito, não sou racista, mas os turcos... não posso nem pensar em meu filho parar de estudar, etc. Parece-me fundamental aprofundar mais estas observações, ainda que a repetição de conceitos seja meio exaustiva e chata.

Flavio Gikovate
 

28 de agosto de 2012

Quando o amor está longe dos olhos...



Na era do mundo globalizado, já não existem fronteiras para as conexões de qualquer ordem. E muito menos para o coração! Há algum tempo, relacionar-se com alguém que morava longe era raridade, coincidência, quase impossível. Hoje, as chances de você se descobrir completamente apaixonado por alguém a quem nunca sequer viu pessoalmente são bem grandes!

Como tudo na vida, esta situação tem seus prós e contras. Para alguns, bem mais contras, e é fácil compreender os motivos. Estar longe de quem a gente ama, realmente não é algo que se quer. Porém, como o coração não escolhe cidade, amar alguém à distância requer novas crenças, quebra de alguns paradigmas e muita disponibilidade para fazer dar certo!

Se existe algum segredo para isso, eu diria que tudo começa com a confiança! Se você não acredita no que o outro fala, no que ele diz que faz e no que ele diz que sente (ou vice-versa), dificilmente haverá paz neste encontro, seja ele virtual, por telefone ou esporadicamente ao vivo. E amor sem paz não é amor, é vício!

Mas sabemos que a confiança pode ter bem pouco a ver com a realidade dos fatos e muito mais a ver com insegurança, ciúme, baixa autoestima e medo. Sim! Medo de perder o controle da situação e sofrer uma decepção ou ser traído pelo outro. E, infelizmente, é exatamente esse o maior problema da distância: pré-ocupação.

Isto é, um dos dois ou os dois terminam desperdiçando tempo, energia e romance com pensamentos paranoicos, tentando evitar que algo de errado aconteça e que possa estragar o que está tão bom, o que está dando tão certo, o que nenhum dos dois gostaria de perder!

Quer saber de uma verdade in-dis-cu-tí-vel? Não temos controle sobre o outro. A vida acontece a despeito de nossas vontades e de nossos medos! Não podemos prever o futuro! Não podemos evitar a chegada do amanhã! Mas podemos, com certeza, viver o hoje, o agora, o presente da melhor maneira que sabemos, com o melhor de nós! Podemos ser coerentes com o que sentimos sem passar a vida toda tentando não sofrer!

Sofrer faz parte, em qualquer circunstância, a qualquer distância. Sofrer é humano! No mais, deve servir para nos fazer crescer e amadurecer. Para nos fazer entender que relacionar-se com alguém é a maior chance de aprendizado que podemos ter durante toda a nossa história. Além disso, sofrer é só uma parte. O resto tem de ser alegria, desvelo, prazer!

Portanto, se você está vivendo um amor à distância, aproveite! Exercite sua capacidade de investir neste dia, neste momento. Fale do que sente agora, fale de você, fale do outro, para o outro e escute-o como uma carícia! Pare de "viajar na maionese" ou de insistir em responsabilizar o outro pelas "minhocas" que são suas. Sugira parceria e não briga!

Conte sobre seus medos e até sobre sua insegurança. Revele o quanto esse encontro é importante para você e o quanto gostaria de fazer dar certo. Tire suas dúvidas. Pergunte, mas não intime! Não pressione ou exija garantias! Amor não é feito de garantias e, sim, de desejo. Desejo de ver, de ficar mais perto, de ultrapassar limites, de quebrar muros e vencer os quilômetros.

E saiba que, mais cedo ou mais tarde, quando se sentirem prontos, terão de encontrar um modo razoável para minimizar e, por fim, acabar com qualquer distância entre vocês. Porque, afinal de contas, amor consolidado pede compromisso, cumplicidade e intimidade. Pede olho no olho, mão na mão, corpo no corpo. Amor de gente grande é aquele que a gente compartilha integralmente, pouco a pouco, e sem restrições. Deste modo, espere o tempo que julgar necessário e justo, ame à distância enquanto assim for preciso, mas tenha em mente o que sente e o que quer! E atenda à voz do seu coração!
 
 
Rosana Braga 
 
 

A gente se acostuma




Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.

A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.

A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A tomar o café correndo porque está atrasado. A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá para almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.

A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.

A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagará mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.

A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.

A gente se acostuma à poluição. Às salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às bactérias da água potável. 

A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e sua no resto do corpo. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.

A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.


Marina Colasanti


27 de agosto de 2012

Os opostos se atraem, mas não se entendem




É voz corrente, que nos relacionamentos afetivos, os opostos se atraem. Diante do fato, a gente se posiciona de forma curiosa: como sempre ouvimos falar disso, consideramos a afirmação absolutamente verdadeira. Não duvidar de sua lógica parece nos conduzir a um porto seguro e acabamos acreditando que o fenômeno é inevitável.

Por acaso alguém já se questionou a respeito? Afinal de contas por que os opostos se atraem? Trata-se de uma fatalidade, de uma lei da natureza que nos leva a bons resultados? Acho muito importante assumir uma atitude crítica e de reflexão em torno dos problemas do amor, pois é a emoção que mais dor e sofrimento nos tem causado. São raras as pessoas realmente felizes e realizadas nessa área. Devem existir muitos erros e ignorância em relação ao amor. Aliás, é só de algumas décadas para cá que os profissionais de psicologia – e, ainda hoje, poucos entre eles – começaram a se interessar pelo assunto, até então reservado aos poetas.

Gostaria de externar de modo categórico a minha opinião, fundamentada em muitos anos de experiência como psicoterapeuta: os opostos se atraem, mas nem por isso combinam bem. O resultado desse tipo de união não é obrigatoriamente um sucesso. Pessoas muito diferentes vivem brigando e se irritando uma com as outras. Temperamentos e gostos antagônicos dificultam a vida em comum. Durante o período de namoro, os obstáculos existem, mas não são tão importantes, uma vez que são raras as coisas práticas compartilhadas. Após o casamento, porém, as divergências infernizam o cotidiano. Como encaminhar a educação dos filhos se os pontos de vista são tão diferentes? Como planejar a economia doméstica, a ordem dentro de casa, as viagens de férias?

Na prática, ocorre o seguinte: os opostos se atraem, mas na rotina da vida em comum as contradições se acirram. Começa então a tarefa de cada um tentar modificar o outro. O marido quer moldar a mulher de acordo com o seu modo de ser; a mulher deseja que o marido a compreenda e se aproxime dos seus pontos de vista. Será que isso é possível? Não deveriam diminuir as diferenças com o convívio? Deveriam, mas não diminuem, talvez por causa do medo de ver o encantamento amoroso desaparecer. Sim, porque afinal de contas os namorados se sentiram atraídos exatamente por serem polos opostos. Se ficarem parecidos, não acabará o amor? Os casais convivem por anos, sempre se desentendendo, sempre procurando fazer do outro um semelhante e só conseguem agravar as diferenças e piorar as brigas.

Não deixa de ser ironia que a gente se sinta fascinado por pessoas com as quais não teremos um bom convívio. Esse fenômeno é responsável por um enorme número de uniões infelizes e que, hoje, acabam em divórcio. Cabe indagar: a atração por opostos é inevitável? Acho que não, apesar de ser muito comum, especialmente na adolescência. Considero fundamental entendermos as razões que levam a esse tipo de encantamento. Conhecendo-as, poderemos evitar o erro e nossas chances de sucesso no amor aumentarão bastante.

A principal causa do magnetismo entre opostos é, sem dúvida alguma, a falta ou diminuição da autoestima. Quando não estou satisfeita com o meu modo de ser, procurarei alguém que seja completamente diverso. Se eu for introvertido e tímido, a tendência será me apaixonar por uma pessoa extrovertida e sem inibição. Com o tempo, o que suscitava minha admiração e era uma qualidade se tornará fonte de irritação, mas no início ficarei encantado. Ao ter o outro, tenho a extroversão que me faltava. Sinto-me mais completo. Tudo muito lógico na teoria. Na prática, as diferenças nos desagradam, dificultam nossas vidas, criam barreiras e resistências cada vez maiores. Elas são responsáveis pelos atritos constantes e pelas brigas normais entre marido e mulher. Será que são mesmo normais?


Flávio Gikovate



26 de agosto de 2012

A importância de ser e de ter amigos




Ter e ser amigo são experiências das mais profundas que se pode viver. Traz sentimento de liberdade, de poder se expor e de compartilhar experiências de modo totalmente espontâneo e franco, ao mesmo tempo que íntimo. Neste tipo de relação de confiança recíproca, amigos espelham-se um no outro e a partir disso costuma acontecer a dança de papeis onde ora se é o amigo, ora o irmão, ora o pai, ora a mãe e por aí vai, tudo no intuito da ajuda mútua.

Mas como chegar nesse lugar? É fácil? Simples? Na amizade real, a sensação que fica é a da liberdade de poder se expressar naquilo que estamos sendo no momento e como consequência, esclarecimento maior sobre nós mesmos e sobre a vida. O não-julgamento do amigo permite expansão genuína de amor, respeito e cumplicidade somados à expansão das afinidades.

O encontro amigo evoca rompimento com inúmeros preconceitos e certamente nos farão pensar sobre outros tantos dogmas por nós navegados de modo cego. A aceitação do outro leva ao conhecimento inequívoco de nós mesmos. Na amizade sincera, é inevitável todos saírem da própria superficialidade cedendo lugar à maior intimidade e aprofundamento em si mesmo. Logo no início das amizades, muitas pessoas imaginam-se íntimos e profundos, mas ainda estão à beira de um processo onde ocorrerão as brigas e desacordos, resultado de relacionamentos maduros, para que aprendizados se estabeleçam.

Uma amizade salutar ou mesmo um grupo de amigos saudáveis promove autoconhecimento diferenciado. É através das relações de amizade que se consegue transitar nos mais diversos ambientes emocionais e onde paradoxalmente se aprende a ter autonomia sobre todo tipo de escolha, inclusive, sobre as próprias amizades.

Na frenética e ainda inconsciente sede do encontro consigo mesmo, muitas vezes é pelo intermédio do outro que a virada ocorre, ou seja, que o encontro genuíno se revela. Num repente e, nunca desapercebidamente, o sagrado de estar com um amigo de verdade é sentido e vivenciado emocionantemente. Ter muitos amigos, porém, não significa que você tenha amigos de verdade. Amigos de verdade querem o seu bem e estão com você tanto na chuva, quanto na dor, quanto na alegria.

Amigos falsos lhe usam apenas para que você possa alegrar a vida deles, dar mais dinamismo, escutar continuamente problemas que nunca mudam. Amigos falsos não sabem ouvir, não têm essa capacidade. Amigos falsos lhe usam para não saírem sozinhos ou mesmo o levam nos lugares apenas e tão somente para competir com você. Para você dar suporte, a fim de que se sintam minimamente melhores do que os outros e do que você.

Observe o tipo de amizade que você tem atraído para si mesmo e, se tiver alguma questão em relação, reflita o porquê disso tudo. Honestamente, pergunte-se também que tipo de amigo você tem sido? No final, veja se o que deseja para sua vida está compatível com as amizades que tem.

Quando não se identifica com as amizades, quando frequentemente se sente usado pelos amigos ou mesmo quando é constante a perda dos mesmos, um processo de terapia em busca de autoconhecimento é altamente indicado. Quando se está só e sem amigos, também é um bom motivo para começar a se questionar e ver o que acontece.

Ninguém vive sozinho. Conhecemo-nos através da relação que temos com o outro. Quando não há relação alguma, há o que se pensar a respeito. Por isso mesmo, iniciar uma relação com um terapeuta muitas vezes serve para superar dificuldades desta ordem. Nestes casos, as pessoas que iniciaram terapia comentam que deviam ter começado muito antes. Não tinham noção de como carregavam traumas e inserções de culturas familiares, desde a infância, fazendo-os ser o que são hoje. Tem muita coisa que comanda a vida das pessoas e elas não sabem de onde vem e mesmo quando sabem, se estão sozinhas, tem dificuldades para mudar.

A questão não é a conquista do diferente, mas a conquista de ser você mesmo, de descobrir o que se gosta, o que não se gosta e na sequência, de usufruir de tudo com sabedoria. Ter amigos, ser amigo, ser seu melhor amigo. Autoconhecimento, amor, vida.


Silvia Malamud 
 

25 de agosto de 2012

Você é um dependente afetivo?





Há pessoas que se arrepiam só com a possibilidade de ficar dependente de alguém ou alguma coisa, passam a vida lutando contra isso, e algumas vezes tornam-se onipotentes, distantes e sós. E há pessoas que tremem apenas com a ideia de dependerem principalmente de si mesmo; confundem individualidade com solidão, abandono e rejeição. São as duas faces da mesma moeda, os primeiros temem se envolver e perder a sua individualidade e o outro extremo teme tê-la. Na verdade ambos acreditam que a autonomia e a capacidade de cuidar de si, tomar as próprias decisões, fazer escolhas, está fora de seu controle, ou melhor, fora de si.

A dependência afetiva é um estado de imaturidade que faz parte do processo natural de desenvolvimento humano, ou seja, nascemos totalmente dependentes, tanto fisicamente como afetivamente. Com nossas vivências e experiências vamos evoluindo de forma gradativa buscando nossa independência emocional.

Algumas vezes temos clareza de nossas dificuldades, então nos resta pelo menos duas saídas: enfrentá-las e superá-las, mas nem sempre a dependência afetiva é consciente.

Uma pessoa é dependente afetivamente quando sua autonomia está prejudicada, ela precisa de algo ou alguém para sentir-se segura e tranquila, nas mais diferentes decisões em sua vida, desde as mais simples como decidir que roupa vai usar por exemplo, ou até as mais difíceis, como que profissão escolher... se muda de emprego ou não... se continua namorando ou não, se casa ou não... enfim, inúmeras situações onde está implícita a escolha.

Você deve estar se perguntando: mas, todos nós não gostamos de uma opiniãozinha às vezes? Sim, é verdade, pedir a opinião de alguém sobre algo não o torna dependente afetivo. A diferença está quando você depende realmente dessa opinião e não consegue seguir o seu desejo se ele não for aprovado se não houver o aval de alguém. O objeto de dependência entra na vida da pessoa como uma muleta, ocupa um espaço vazio. A dependência pode ser de uma pessoa específica, uma droga, uma atitude de carinho, uma palavra amiga, ou mesmo de alguém que lhe possa ouvir ou dizer o que deve fazer.

Na verdade essas pessoas ou objetos tem uma única função para o dependente afetivo, dar a sensação de segurança que precisa para suportar problemas, tensões e dificuldades pessoais e/ou sociais. A questão é que a segurança não está nas relações que fazemos, não é algo que vem de fora é algo que existe ou não dentro de nós. Nossa segurança e autoestima são os reguladores de nossa maturidade emocional.

No Psicodrama dizemos que toda a saúde e doença emocional nasce nas relações, ou seja, são aprendidas durante o desenvolvimento através dos modelos que recebemos primeiramente por nossa família de origem e secundariamente através das demais relações que vivenciamos durante a vida. Nos primeiros anos de vida necessitamos da confirmação de nossas atitudes, da certeza de que nosso comportamento está sendo aceito pelas pessoas que amamos. Com o nosso desenvolvimento emocional, passamos a desejar e não mais necessitar dessa aprovação. Aprendemos a nos relacionar com o mundo pelas regras que recebemos em nossa família. A criança é espontânea e criativa por natureza, ninguém nasce culpado em ser espontâneo. A dependência afetiva muitas vezes nasce e é sustentada por problemas no relacionamento familiar, pelos conflitos pessoais, pela sensação de rejeição e de não ser aceito.

Na verdade ninguém é dependente sozinho, dependência afetiva é uma via de mão dupla, se uma criança é dependente afetivamente, a mãe com certeza também o é, pois neste caso, a mãe é quem a estimula e acredita em seu potencial ajudando-a a ter a certeza que conseguirá superar suas dificuldades. Dessa relação, nasce a autoestima e a sensação de segurança pessoal. Todo o ser humano nasce com uma capacidade de cuidar de si, um potencial que precisa ser estimulado e se não recebe este estímulo torna-se dependente. Na prática acabam por não confiarem em si mesmas e em seu valor pessoal, deixam de oferecer o seu melhor na vida, no trabalho e em seus relacionamentos. Não podemos perder de vista o humano que existe em nós, somos criatura e criadores capazes e genuinamente, imperfeitos.


Sirley Bittú