1 de dezembro de 2010

Para ajudar a superar a dor da perda



Morte de alguém que amamos. Separação. Quem não passou por essas perdas? No ranking dos motivos de estresse e dor, essas situações estão no topo da lista. Muita gente não consegue superar e se afunda em tristeza e depressão. Atendendo pacientes em seu consultório há 40 anos, o psiquiatra carioca Luiz Alberto Py lançou o livro Amor e Superação – como enfrentar perdas e viver lutos, da editora Rocco. A obra, segundo ele próprio, é um “mapa do pântano”. Do pântano que temos que atravessar para superar as surpresas ruins da vida. A seguir, Py fala sobre seu livro e suas experiências.

Por que você decidiu fazer um livro sobre as perdas e lutos?

Talvez porque seja algo que acontece com todas as pessoas, sem exceção. É universal. Todos passamos por isso, de uma forma ou de outra. Acredito que seja um tema que interessa a todos. E é uma situação difícil para qualquer um. Como psicanalista, lidei com pacientes que estavam passando por este momento de perda. E eu mesmo tive experiências pessoais impactantes. Acredito que, como tudo isso somado, consigo transmitir alguma coisa substancial sobre o assunto, apontando caminhos de superação. O que eu escrevo é produto do meu trabalho profissional.

Você falaria sobre suas experiências impactantes?

Em 1987, meus três filhos mais velhos sofreram um grave acidente de carro. Tinham 18, 16 e 14 anos. Um deles ficou quinze dias em um hospital, entre a vida e a morte. Ele sobreviveu, mas durante duas semanas eu experimentei a ideia da perda. Pensei muito sobre isso. Sobre como ficaria a vida. Sobre o que eu diria pra mim mesmo se ele morresse. Pouco tempo depois, um amigo de meus filhos, filho do Gilberto Gil, morreu em um acidente de carro. Aquilo me tocou muito, era um menino que eu gostava. Eu havia sido até técnico de futebol dele. E aquilo me levou de volta à ideia da morte de um filho. Como superar essa perda, que é a pior delas?

Entre tantos, qual o primeiro passo para enfrentar situações trágicas?

Talvez seja o desapego a tentativa de buscar, lá no fundo, a alegria do que tivemos enquanto aquela pessoa que amamos estava conosco. E não focar no lamento da perda. Contamos com o futuro ao lado daquela pessoa, mas é algo virtual. Perdemos o que não ganhamos ainda. Sei que é difícil de pensar assim, mas é um caminho racional e interessante. A Cissa Guimarães, que perdeu o filho recentemente numa situação trágica, tem apresentado um comportamento próximo a isso. Ela sofre, é claro. Mas já deu entrevistas dizendo que vai voltar a ser alegre, que a vida continua e, principalmente, como é feliz de ter sido mãe do Rafael. Como foi bom ele ter passado pela vida dela. Colocar o foco na boa lembrança é muito saudável. É pensar: esse filho ninguém pode me roubar, ele será meu para sempre, não importa o que tenha acontecido.

Vale o mesmo para as separações de casais?

É parecido. A gente também conta como futuro ao lado daquela pessoa e ela vai embora, some de nossa vida. Só que a separação tem um componente a mais muito ruim: a ideia da rejeição. E muitas vezes isso é pior do que a morte. Tive uma experiência pessoal dolorosa também nessa área. Há alguns anos, quando meu filho mais novo tinha um ano, a mãe dele disse que iria embora. Quis se separar. Foi uma enorme surpresa. A dor desse abandono é muito forte. Você se sente julgado e condenado. Quando alguém morre, ela se vai sem querer ir. Quem fica sofre, mas não se sente rejeitado. Então lidar com essa dor também é muito difícil.

Você diz que é preciso curar a ferida com desapego. A sociedade atual dá espaço para este desapego?

Vivemos num mundo da rapidez e do consumo. Mas é preciso aprender a abrir espaço para o desapego. O desapego é a condição para a verdadeira liberdade. Quanto mais malas carregamos, menos conseguimos viajar.

As pessoas, de modo geral, reagem mal às perdas?


Sim, são raros o que sabem lidar com a dor. Porque é mesmo uma travessia difícil. Fica o vazio de expectativas, a quebra daquilo que esperávamos que fosse acontecer. Por isso escrevi o livro: para estender para mais pessoas aquilo que costumo fazer individualmente, no consultório. Eu tenho dito que este livro é um mapa do pântano, com indicações de saída e de como evitar caminhos perigosos e as areias movediças da entrega, das soluções equivocadas.

Quem reage melhor às perdas, homens ou mulheres?

À perda pela separação, com certeza as mulheres. Os homens, mesmo quando estão em casamentos muito ruins, não querem acabar com a relação de jeito algum. Mesmo hoje, os homens são mais dependentes. A mulher administra muito a rotina do homem e da casa. Quando elas querem separar – mesmo quando a culpa é deles -, os homens ficam sem chão, não sabem o que fazer. Em relação à morte, de um pai ou de um filho, acho que é algo mais equilibrado. Aí o que pesa mais não é o gênero, mas a idade, a maturidade. Agora, em relação à viuvez, as mulheres também se saem muito melhor. Elas costumam ter uma rede de amigas, gostam de se divertir mesmo na terceira idade. Já os homens tendem a se fechar em casa. Minha experiência mostra que é mais comum os homens morrerem logo depois das companheiras do que o contrário. Viúvas, ao contrário, muitas vezes renascem depois dessa perda.

Martha Mendonça 

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