27 de abril de 2011

Tentar mudar o outro




Parece fácil amar outra pessoa. Porém, a convivência diária traz aborrecimentos e os gestos românticos se escasseiam. Uma conversa franca pode complicar em vez de resolver. Não tente encaixar o outro na forma que você idealizou. Apenas o aceite. No mundo de esperanças, medos, prazeres e lágrimas.

O que mantém o vínculo são dezenas de fios invisíveis (segredos compartilhados, promessas cumpridas)que ligam uma pessoa à outra através dos anos. Um mundo feito de corações que se escutam, racham, quebram e voltam a se colar.

No começo parece tão fácil amar outra pessoa. E o sexo... Bem, o sexo é divino. Os olhares, sorrisos e gestos falam mais do que as palavras. É tão bom descobrir de quantas formas diferentes somos capazes de compartilhar, de nos fundir com a pessoa que amamos... Acontece que junto com as afinidades vêm as hostilidades geradas pelo conflito de querer amar e de se sentir obrigado a amar.

A familiaridade com o companheiro traz à tona suas imperfeições. Pequenos aborrecimentos se agigantam e mesmo os gestos românticos vão se escasseando. Pouco a pouco, a realidade toma o lugar das imagens idealizadas. Brigas acontecem, mas, naturalmente, a culpa é sempre do outro. "Ele já não é o mesmo de antes; portanto, é o responsável pelos problemas que estamos enfrentando."

É sempre mais fácil encontrar uma causa externa em vez de olharmos para nós mesmos. "Eu gosto de metade de você. O que faço com o resto?"

De alguns anos para cá, muitos casais valorizam o diálogo como forma de resolver esse problema. Revistas, cursos e terapeutas passaram a dizer que o importante é pedir o que se deseja. "Tenha uma conversa franca e sincera com seu parceiro, exponha o que você realmente quer e assim tudo vai se resolver."

Embora uma boa conversa seja um ponto de partida razoável, não é suficiente. Nós fomos levados a acreditar que a mudança, até mesmo uma transformação radical na relação, era algo totalmente possível: se o outro realmente amasse, ele faria esforços sobre-humanos para caber na forma que você idealizou. Mas na prática não é bem assim. Foi ensinado às pessoas que a negociação é essencial em um bom relacionamento. É possível negociar tarefas e alguns comportamentos específicos, mas não a personalidade do outro. É impossível modelá-lo, transformá-lo.

No livro Maridos e Mulheres, Melvyn Kinder e Connell Cowan explicam que uma pessoa pode querer mudar, mas de algum modo achar isso dolorosamente difícil. Muitos dos traços da nossa personalidade foram desenvolvidos como meios de nos proteger de danos psicológicos. Hoje podemos não precisar desses mecanismos de defesa, mas eles persistem.

Por mais que queiramos modificá-los, inconscientemente ainda sentimos que precisamos deles. Estes traços que incomodam ou enfurecem são, para a outra pessoa, formas de enfrentar a vida e de sobreviver. Ninguém quer contrariar seu parceiro, todos nós tentamos agradar, só que nem sempre conseguimos. E acabamos fazendo coisas que machucam.

Temos de aceitar tanto os defeitos como as qualidades do outro. Amor é aceitação. Nem sempre falar francamente fortalece o relacionamento.A afirmação parece contrária a tudo do que se disse nos últimos tempos, mas a experiência provou que às vezes "é melhor calar. E agir."

É ingênuo imaginar que basta expressar claramente os sentimentos para que o parceiro nos compreenda. Quando duas pessoas resolvem falar tudo o que pensam e sentem, podem ficar mais informadas, mas também podem acabar mais machucadas e ressentidas. Certas coisas não devem nem precisam ser ditas, por mais verdadeiras que sejam, pois não ajudam em nada e costumam provocar devastação emocional.

A superação das decepções devido ao fato de o outro não ser como tínhamos sonhado é uma dura tarefa. Mas se descobre lentamente, muito lentamente, que se pode amar alguém apesar de suas falhas.

Por outro lado, precisamos lembrar que é impossível mudar o outro, mas não a nós mesmos, pois todos estamos constantemente nos modelando. A vida é, afinal, uma procura dos segredos do crescimento e ninguém os conhece plenamente.



Maria Helena Matarazzo

11 comentários:

Meire Oliveira disse...

Quase sempre erramos querendo que as pessoas sejam como desejamos ou que ajam da maneira que agiriamos diante de alguma situação. O fato é que temos que gostar das pessoas com suas qualidades e defeitos...as pessoas que dizemos "não gostar" não é porque ela tem defeitos e sim porque ela tem algum defeito do qual não consiguimos lidar e/ou conviver com ele. Complexo né?! rsrs Adorei a reflexão...um bjo grande pra ti =D

Sônia Silvino (CRAZY ABOUT BLOGS) disse...

Leninha!
Só mesmo a convivência para que possamos realmente conhecer o outro: cair de paixão ou de desilusão! rs
Estou levando o selinho! Parabéns e sucesso sempre, minha linda e talentosa amiga!

Pena disse...

Divinal e Genial Amiga:
Um texto soberbo e intenso do seu sentir a vida. O mundo. Feito de circnstâncias por vezes adversas.
Registei:
"...Não tente encaixar o outro na forma que você idealizou. Apenas o aceite. No mundo de esperanças, medos, prazeres e lágrimas..."

Achei o pensamento extraordinário de imensa significação que dá para pensar.
Excelente, amiga.
Beijinhos amigos perante a sua genialidade e encanto.
Com respeito pelo que concebe de deslumbrar.
Linda.
Sempre a admirá-la

pena

Bem-Haja, pelo seu valor imenso numa pessoa perfeita.
MUITO OBRIGADO pelo seu constante carinho que agradeço.
Bem-Haja, notável amiga.
Adorei.
É extraordinária e fantástica no que concebe de ternura e beleza.
Parabéns.

Ani Braga disse...

Que texto maravilhoso esse da Maria Helena Matarazzo...

Amor é aceitação.

Tenho pra mim que as pessoas não são iguais, e na maioria das vezes é isso que nos atraí no outro, por isso nos apaixonamos, amamos e nos entregamos.
Não porque a pessoa é diferente da gente, mas por ter pequenas diferenças que nos chamam a atenção e se nós queremos mudar isso, não acho que seja amor, acho que seja uma forma de provar que estamos sendo amadas, que estamos no controle da relação. Porque quando as pessoas aceitam nossas "vontades" elas nos amam, mas quando nos contrariam de alguma forma a gente chega rapidinho a conclusão: Não era ele...

E era!!!! E é... Basta a gente se aceitar e aceitar o outro...

Amor... Só amar...

É difícil pra caramba, mas creio que não seja impossível...

Grande beijo

Ani

Syspil disse...

Acabo de conhecer o seu blog e adorei. Toca fundo nas nossas emoções. O relacionamento humano tem muitas facetas que nos deixam sem chão muitas vezes. Só parando para respirar e meditar um pouco sobre o que pensamos ou como estamos reagindo é que conseguimos superar algumas dificuldades. Um beijo grande.
sissy-atelier.blogspot.com

Regina Antunes disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Lady M disse...

É nisso que, quase sempre erramos, amiga! Tentando mudar a pessoa que conhecemos e amamos, assim como ela é. Passando pra te conhecer, adorei. Já te seguindo, te linkei nos meus favoritos. Bjks.

Sandra Portugal disse...

Já anotei o livro para a minha lista de títulos a adquirir para ler! bela escolha, como sempre! bjs Sandra
http://projetandopessoas.blogspot.com//

Sobre o Tempo disse...

Oi Lena! Ando sem tempo ultimamente. Muita correria. Li o texto. Muito bom.
Hoje li a seguinte frase:
"Comece em você tudo aquilo que quer mudar no outro”. Não sei quem é o autor. Penso que combina com o texto aqui postado. Ótima semana! Bjs

Marluce, em palavras disse...

Lena,


Um texto assim que instiga questionarmos o nosso comportamento diante do outro, dos seus "defeitos", provoca pensar e isso é bom para descobrirmos quem somos diante do companheiro!


um abraço, Marluce

dicasetruques disse...

Ola Amiga, muito bom seu cantinho.Parabens e obrigado pela visita. Bjs no coração