19 de setembro de 2012

Perdoar é desfazer a ilusão da vida perfeita




Não se trata de esquecer a maldade alheia ou minimizar o próprio sofrimento. Para ser capaz de um perdão verdadeiro e sadio basta entender que ele traz muito mais benefícios do que o rancor. Se guardar mágoas e alimentar sentimentos de vingança permitem ilusões como a de que somos perfeitos, perdoar leva à libertação.

Todos fomos machucados na vida. Todos fomos rejeitados por um amante, traídos por um amigo, passados para trás numa promoção. Apesar de aprendermos que "perdoar é esquecer" ("o que passou, passou"), a maioria de nós acredita que as pessoas que nos feriram devem pagar pela dor que nos causaram; afinal, elas merecem ser castigadas, mesmo que inconscientemente ("nada como um dia atrás do outro" ou "um dia a pessoa vai ver o que perdeu").

Na verdade, temos muito o que aprender com essas experiências. Em primeiro lugar, perdoar não é retaliar, se vingar ou fazer o outro sofrer tanto quanto nos fez sofrer. Mas, por outro lado, perdoar não é esquecer, deixar para trás quilômetros de mágoa, toneladas de ressentimentos ou ainda fechar os olhos e deixar os "bandidos" se darem bem com as trapaças que cometeram. Quando perdoamos as pessoas que nos machucaram, não estamos dizendo que o que foi feito contra nós não teve importância ("não foi nada") ou não deixou marcas profundas (aquelas a ferro e fogo). Essas perdas foram terríveis e fizeram grande diferença em nossa vida, mas nos ensinaram muitas coisas: tanto a não nos tornarmos vítimas novamente, como não fazermos o mesmo para terceiros.

De fato, algumas pessoas perdoam, outras não, outras estão tentando. Porém, fingir que perdoamos, ranger os dentes, engolir em seco, não é perdoar. Os terapeutas americanos Sidnei e Suzanne Simon, em seu livro Forgiveness, explicam o que significa perdoar e não perdoar. Começam dizendo que não perdoar tem certas vantagens porque nos dá algumas ilusões.

A primeira, e mais comum, é a ilusão de que, se aquele problema não tivesse acontecido, nossa vida seria perfeita. Só bastaria que as coisas tivessem sido diferentes e não tivéssemos sido machucados naquela época e pela pessoa que nos machucou; agora, estaríamos "numa boa". Mas, como aquilo aconteceu, temos a explicação ideal, a desculpa perfeita para estarmos e ficarmos na pior (a responsabilidade da nossa infelicidade é sempre do "outro").

Em segundo lugar, não perdoar nos dá ilusão de sermos perfeitos. Os maus, os bandidos, são os que nos machucaram, e se nós os perdoarmos nunca mais poderemos dividir o mundo ao meio, todos os mocinhos de um lado e todos os bandidos de outro. Vamos ter de aceitar que as pessoas são "híbridas", potencialmente boas e más. Tanto os outros quanto nós mesmos.

Não perdoar também nos dá a ilusão de força, de poder ("agora eu controlo"). Não perdoar ajuda a compensar a sensação de falta de poder que nós sentimos quando fomos machucados. De fato, se trancarmos na prisão de nossa mente essas pessoas que nos machucaram, vamos nos sentir onipotentes ("agora é minha vez") pela força do nosso ódio silencioso.

E, por último, não perdoar nos dá a ilusão de que não seremos machucados outra vez. Mantendo a dor viva, os olhos bem abertos para qualquer perigo em potencial, reduzimos o risco de voltamos a sofrer rejeição, traição ou qualquer outra forma de ferimento.

Mas será que os benefícios de não perdoar valem o preço que pagamos por armazenar essas mágoas, remoer esses sentimentos e nos agarrarmos com unhas e dentes à dor do passado? Será que vale a pena continuarmos alimentando a raiva, revidando com palavras ou com silêncio e assim nunca sentirmos o verdadeiro prazer de viver?

O perdão se torna uma possibilidade quando a dor do passado para de reger nossas vidas; quando não precisarmos mais do ódio e do ressentimento como desculpas para obter menos da vida do que queremos ou merecemos. Perdoar é chegar à conclusão de que já odiamos bastante e não queremos odiar mais; portanto, perdoar é usar a energia da vida, não para reprimir esses sentimentos, mas para quebrar o ciclo da dor se voltando para o futuro e não machucando outras pessoas como fomos machucados.

Há quem diga que perdoar é escolher entre se vingar e se aproximar, entre ser vítima ou sobrevivente. Na realidade, perdoar é um processo que vem de dentro. É uma libertação. Uma aceitação. Perdoar é aceitar que a coisas ruins podem e de fato acontecem na vida das pessoas, e que as pessoas mesmo quando amam, se machucam. Perdoar é um sentimento de bem-estar, é reconhecer que existe algo melhor que queremos fazer com a energia da vida e fazê-lo.


Maria Helena Matarazzo 



5 comentários:

Penélope disse...

Sim, perdoar aos outros e a nós mesmos, faz muito bem e sempre ajuda a seguir em frente.
Beijinhos minha linda e meu carinho!!!

Sobre o Tempo disse...

Oi Lena! Ótimo texto! Postei um parecido com este que também tem como tema o perdão. A maioria das pessoas não conseguem perdoar. Desejam todo o mal do mundo para aquele ou aquela que traiu ou decepcionou de alguma forma. O sentimento de vingança também se faz presente muitas vezes. É um assunto um tanto complicado, mas penso que perdoar é se libertar. Ótima tarde! Bjs

Célia disse...

Perdoar é uma essência de nossas vidas que leva um tempo até porque é um processo e como tal tem fases de construção.
[ ] Célia.

Leninha Brandão disse...

ë difícil, Lena, mas não é impossível...lugar comum, mas verdadeiro...tenho exercitado a minha capacidade de perdoar ao extremo, últimamente, tendo algumas vezes conseguido e em outras não.Mas vou continuar tentando, principalmente no que concerne a me perdoar, sagitariana perfeccionista que sou.

Belo e reflexivo texto, amiga.

Bjssssss,
Leninha

Marites Rehermann disse...

Olá, Lena!! Adorei este post!! Aprendi que perdoar não é esquecer, pois, esquecer é uma questão de tempo, não depende da nossa vontade. Perdoar, é tirar a mão da garganta do outro, ou seja, não desejar o mal, não querer se vingar, não sentir raiva quando lembrar o ocorrido. E isso, depende de sentimento. Posso ser magoada por alguém, e na semana seguinte quando lembrar, não sentir nenhuma raiva ou sentimento negativo em relação ao agressor. Ou posso lembrar do fato daqui à dez anos, e sentir a revolta tomar conta do meu ser. Isso sim, depende de mim, os meus sentimentos em relação à pessoa, o resto, só o tempo cura!!

Beijinhos!!♥