Tem momentos em que o
mundo se parece como um grande muro à nossa frente. Diante de problemas
complexos ou nos deparando com o caos da cidade, temos que encarar o mesmo
desafio mental: dissolver uma barreira que nos parece intransponível.
A internet não funciona, o
trânsito está pesado, o barulho é intenso. Quando finalmente você chega ao
local marcado, fica sabendo que seu compromisso foi cancelado... E assim vai,
cada um conhece as resistências e os desafios que enfrenta no seu cotidiano. O
ponto aqui é saber como nos mantermos abertos quando o "mundo" se
fecha para nós.
O budismo nos ensina que
nossa sanidade básica está sustentada pela capacidade interna de nos mantermos
abertos e receptivos. Este senso de abertura nos permite atrair novas
possibilidades. É como dizer: "Ok esta porta está fechada, mas posso ir
por outra". O desafio está em conseguirmos manter um senso de perspectiva
constante, principalmente quando nos defrontamos com uma porta fechada depois
da outra.
Quando nossa mente se
fecha, torna-se fixa e raivosa. O desconforto da falta de espaço dentro e fora
de nós cresce na medida em que nos vemos paralisados, sem recursos para agir.
Quando temos a sensação de não haver saída: tudo se torna agressivo. Onde quer
que nos movamos, deparamo-nos com outro obstáculo. Por menor que ele seja, gera
mais uma irritação. Como recuperar as forças diante de tanta pressão?
O melhor é parar. Desistir
de insistir. Assim como a água se mantém turva enquanto estiver turbulenta,
temos que nos aquietar para recuperar uma visão clara. Aquietarmo-nos sem nos
deixarmos ser tomados por uma sensação de fracasso e derrota. Lama Gangchen
Rinpoche me disse certa vez quando estava enfrentando alguns "portões
fechados": "Não olhe para a sombra, mas para o lado da realidade. Uma
mente cientista é capaz de analisar a realidade sem gerar dúvidas". Ou
seja, devemos nos manter parados o tempo suficiente para que surja em nós a
disponibilidade interna de olhar para todos lados. Pois, enquanto nossa mente
estiver lutando para ver algo, permanecerá defensiva.
Os primeiros sinais de uma
nova abertura mental surgem quando temos o desejo de conhecer algo sem
intelectualizar demais. Deixar-se levar por uma certa curiosidade, mas sem
ainda aprofundar nossos conhecimentos de forma a já definir o caminho a seguir.
Na medida em que nos
conectamos com esta sensação de interesse pela novidade recuperamos nossas
forças, pois é a partir desta nova atitude que nos damos uma nova chance. Quanto
mais perspectivas tivermos, mais seguros nos sentiremos para seguir adiante.
Durante esta "parada
obrigatória", podemos aproveitar o tempo para recuperar uma visão
panorâmica e reconhecer como as coisas estão ligadas umas às outras. A partir
desta visão interdependente, novas perspectivas podem se manifestar. Caso
contrário, será como agitar novamente a água, tornando-a turbulenta. Temos que
parar o tempo o suficiente para recuperar o espaço interior.
O budismo nos lembra que a
raiz de nossos pensamentos de sofrimento está no hábito de dar solidez à
realidade. Quando projetarmos a ideia de que as coisas são imutáveis, densas e
concretas, criamos uma separação entre nós e o "outro", entre o que
acontece dentro e fora de nós. Quanto maior for a ideia de que as coisas são
fixas maiores nos aparecerão os obstáculos.
Ao ser perguntado:
"Como lidamos com as situações práticas da vida enquanto tentamos ser
simples e experimentar o espaço?" Trungpa Rinpoche respondeu: "Veja
bem, a fim de experimentar o espaço aberto, precisamos também experimentar a
solidez da terra, da forma. Eles são interdependentes. Muitas vezes damos um
aspecto romântico ao espaço aberto e depois caímos em armadilhas. Contanto que
não romantizemos o espaço aberto, imaginando-o um lugar maravilhoso, mas
relacionando o espaço à Terra, evitaremos as armadilhas. O espaço não pode ser
experimentado sem os contornos da Terra para defini-lo. Se formos pintar um
quadro do espaço aberto, teremos de expressá-lo em termos do horizonte da
Terra.
É preciso, portanto, voltarmos aos problemas da vida cotidiana, aos
problemas banais. Essa é a razão de serem tão importantes a simplicidade e a
precisão das atividades diárias. Se percebermos o espaço aberto, deveremos
retornar às nossas velhas, familiares, claustrofóbicas situações de vida e
examiná-las mais de perto, esquadrinhá-las, absorvermo-nos nelas, até que o
absurdo de sua solidez nos chame a atenção e possamos ver-lhe também a
qualidade de espaço". Em seguida, perguntaram-lhe: "Como nos relacionamos
com a impaciência que acompanha o período de espera?" E ele apenas
disse:"A impaciência significa que não temos uma compreensão completa do
processo. Se virmos a totalidade de cada ação, deixaremos de ser
impacientes". (Chögyam Trungpa, Além do Materialismo Espiritual, Editora
Cultrix).
Bel Cesar
3 comentários:
Que saudade deste Amadeirado.
Uma bela escolha para reflexão sobre a espera e o processo de estresse que tanto tem feito vitimas.É preciso arte Lena, para saber respirar e atravessar este muros sobre uma corda esticada.
Bom lhe ver por aqui.
Meu terno abraço mineiro amiga.
Bom e belo fim de semana com paz e alegria.
Bjo.
oi Lena,
sabe que tenho uma amiga budista,
e aprendo muito com ela,
bom demais conhecer outras crenças,
e respeitar as diferenças...
beijinhos
o exercício da tranquilidade..
bela escolha linda Lena..
beijo e lindo findi..
Postar um comentário