6 de agosto de 2010

Beleza cansa



A gente vive num mundo obcecado pela beleza. Ela está na televisão, no cinema, nas capas das revistas, nas lojas dos shoppings, nos bares e restaurantes descolados, onde garçonetes parecem modelos.

A beleza nos é oferecida em doses enormes, em vários formatos, para todos os gostos e gêneros. Há loiras altas, morenos fortes, jogadores de pernas grossas e atrizes de barrigas impecáveis. A beleza nos enche os olhos. É um colírio grátis permanente e intoxicante.

Num ambiente desses, talvez seja inevitável imaginar que beleza é a coisa mais importante do mundo: em nós e nos outros. Essa ilusão circula amplamente por aí, por um motivo simples: a beleza atrai a atenção das pessoas como talvez só a violência consiga com a mesma intensidade.

Diante de uma cena de agressão os nossos sentidos se crispam. Quando uma mulher bonita entra pela porta (imagino que um homem bonito cause o mesmo efeito), as sensações também se alteram, mas desta vez na direção do prazer.

A beleza nos torna atenciosos e solícitos, ao menos por algum tempo. É por isso que ela funciona tão bem nos filmes, nas novelas, na publicidade. O prazer de olhar sequestra os nossos olhos e monopoliza a nossa atenção. Na outra direção, ela dá às pessoas bonitas a certeza de que serão notadas  e a ilusão de que serão amadas.

Mas isso é totalmente bobagem, não é? Todo mundo sabe, ou deveria saber, que a aparência tem um papel importante mas limitado nas relações humanas.

Pense no caso da moça bonita que começou a trabalhar no escritório. Na primeira semana não se fala de outra coisa. Ela é um objeto que os olhos devoram incansavelmente. Passados uns dias, as pessoas se acostumam e o fascínio diminui, até que ela se torne como as outras, uma pessoa normal. Se a moça for uma chata, uma boba, ou uma mosca morta, o processo de “normalização” é ainda mais rápido.

Isso acontece porque, na vida real, nós fazemos contato com a totalidade das pessoas: seus sentimentos, seus modos, sua inteligência, seu humor, seu charme ou sua integridade. As relações humanas reais formam uma teia densa, complexa, na qual a beleza é apenas um componente - relevante, mas não absoluto.

É possível colocar um planeta inteiro apaixonado pela Shakira ou pelo Tom Cruise porque ninguém tem contato com eles. São apenas imagens bonitas, nas quais as pessoas projetam qualquer tipo de sentimento. Mas ponha o Reynaldo Gianecchini ou a Sabrina Sato para trabalhar na mesa ao seu lado. Em uma semana você vai estar reclamando de que ela ri muito alto ou que ele é folgado e se espalha demais para sentar. De perto, todo mundo é meio mala.

E quando se trata de namorar? Em princípio, claro, todo mundo quer gente bonita. Quanto mais bonita, melhor, na verdade. Mas basta olhar em volta pra perceber que não é nada disso.

Aquele sujeito que faz o maior sucesso com as meninas do trabalho, por exemplo. Ele chega ao churrasco da firma com uma mulher que ninguém acha bonita – mas pela qual ele é maluco. E a moça linda, coitada, que dança miudinho na mão de um namorado esquisito e tirânico que só ela acha irresistível? Claro, há aquela garota da praia, absurdamente sensual, com quem o seu amigo saiu duas vezes e não quis mais nada – e agora é ela quem fica pegando no pé dele.

É isso, não é? Beleza, nas relações amorosas, vai até a página dois ou três. Depois tem de incrementar com outras coisas. Ou acaba. Olhar para a sua garota e achá-la arrebatadoramente linda tem mais a ver com estar apaixonado por ela do que com o fato de ela ser realmente tão bonita. Se ela fosse apenas bonita e você não gostasse mais dela, o olhar seria outro.

Vale o mesmo das mulheres para os homens. Quando elas dizem que nós somos bonitos, a mensagem realmente importante é: eu gosto de você, eu vejo beleza em você. Eu estou aqui com você há 10 anos, há um ano ou há seis meses e continuo interessada no que você diz e faz, naquilo que você é. Por isso, continuo achando você bonito.

Na vida real, a percepção da beleza é mais importante do que a beleza. E tem a ver com uma monte de coisas, inclusive a aparência.



Ivan Martins
 
Fonte   

2 comentários:

Maria José Rezende de Lacerda disse...

Lena. Concordo plenamente com isso. A beleza é um conjunto de coisas: o humor, o sorriso, a competência, a lealdade, a honestidade, a confiança, a tranquilidade, a harmonia.... o físico é o que menos importa. Inclusive, cansa mesmo. Beijos, amiga. O seu blog está demais.

Só pra você disse...

Lena,
A beleza está nos olhos de quem a vê... Esse ditado vale para o lado do amor, é claro que existem belezas para serem admiradas, para desfile de modas, para o mundo ver, como é o caso das misses mundos, etc. Mais o coração, esse olha de outra forma, tem um casal que eu sempre lembro, o Jon Lenon, que era casado com um loira bonita e se apaixonou por uma feiosa que foi a Yoko Ono (é assim que se escreve?) e foi muito feliz com ela até morrer, e pôde ser o que ele queria com aquela mulher e todas as músicas de amor foram para ela, falando dela, então, aí entra a beleza nos olhos de quem a vê. Olha, beijos mil por esse teu texto maravilhoso.

Beijocas querida!