24 de julho de 2011

Juventude: a utopia da onipotência




Para derrotar o medo, alguns jovens acreditam ser imunes a qualquer perigo. Vestem a couraça da onipotência e põem em risco seu futuro e sua vida. Até que um dia descobrem porque não são imortais.

A adolescência é uma fase extremamente difícil da vida. Talvez a mais difícil. Temos que nos comportar como adultos sem dispor de cacife para isso. Temos que ser fortes e independentes quando ainda nos sentimos inseguros e sem autonomia de vôo. Temos que mostrar autoconfiança sexual, mesmo sendo totalmente inexperientes. Temos que formar um juízo a nosso respeito - se possível positivo -, mas nos falta a vivência para aprofundar o autoconhecimento. Enfim, temos que ser ousados e corajosos, embora a cada passo surja o medo para nos inibir.

O que fazer? Frente a tantas incertezas, acabamos seguindo os modelos sugeridos pela própria cultura. Passamos a imitar nossos heróis, travestindo-nos de super-homens e de mulheres-maravilha. Assim, encobrimos nossas dúvidas e inseguranças. Elas que sejam reprimidas e enviadas para o porão do inconsciente. Nós seremos os fortes e destemidos, para nós nada de errado ou ruim irá acontecer. Construímos uma imagem de perfeição, de criaturas especiais, particularmente abençoadas pelos deuses. Resultado: sentimo-nos onipotentes e, a partir daí, não há coisa no mundo que possa nos aterrorizar, uma vez que estamos revestidos de proteções extraordinárias.

Este estado de graça irá perdurar por um tempo variável. É um período bastante complicado para as pessoas que convivem com o jovem, pois ele sabe tudo, faz tudo melhor, acha todo o mundo alienado e burro. Só ele é competente e sábio. No entanto, para o próprio jovem, a fase parece muito positiva. Ele, finalmente, se sente bem, forte, seguro e não tem medo de experimentar situações novas. Pode montar o cavalo mais selvagem com a certeza absoluta de que não cairá em hipótese alguma. Mais tarde, quando não for mais tão ousado e confiante, se lembrará dessa época da vida como a mais feliz. Afinal de contas, a sensação de euforia é sempre inesquecível.

Na verdade, ninguém teria nada contra a onipotência, se ela correspondesse à realidade. Porém, não é isso que os fatos nos ensinam. Sabemos que, entre os jovens, são exatamente os mais confiantes aqueles que se envolvem em todo tipo de acidentes graves, quando não fatais. São estes jovens que dirigem seus carros na estrada, durante a madrugada, com o pé na tábua. Não sentem medo porque é óbvio que os pneus não irão estourar e é lógico que não irão adormecer ao volante. São estes jovens que saem de uma festa e, alcoolizados, vão a toda a velocidade para a praia. Sua imortalidade só é desmentida por um acidente fatal. Aliás, para ser sincero, parece incrível que não ocorra um maior número de acidentes.

Alguns jovens, onipotentes e filhos diletos dos deuses, andam de motocicleta sem capacete. Desafiam a chuva e o asfalto molhado, depois de usarem tóxicos ou ingerir álcool. Fazem curvas superperigosas. Não se intimidam porque para eles nada de mal irá acontecer. E morrem ou ficam paralíticos, interrompendo vidas que poderiam ser ricas e fascinantes. Estes mesmos jovens utilizam drogas em doses elevadas porque se julgam imunes aos riscos da overdose e suas graves conseqüências. Chegam a compartilhar seringas, ao injetar tóxicos na veia, pois é claro que não terão AIDS. E, pela mesma razão, continuam a ter relações sexuais com parceiros desconhecidos, sem sequer tomar o cuidado de usar camisinha.

Aqueles que não morrem ou não ficam gravemente doentes, um dia acordam desse sonho em que flutuavam em estado de graça. Acordam porque lhes aconteceu algo: aquele acidente considerado impossível. Caíram do cavalo. Eles também são mortais! 
Então, tomam consciência de toda a insegurança e de toda a fragilidade que os levaram a construir a falsa armadura da onipotência. Ao se tornarem criaturas normais, sentem-se fracos. Antes era muito melhor. Sim, mas era tudo mentira. Agora, o mundo perdeu as cores vibrantes da fantasia. Vestiu os meios-tons da realidade. Eles não conseguiram domar o cavalo selvagem e foram derrubados no chão. Terão de aprender a cair e se levantar. Terão de aprender a respeitar mais os cavalos! Terão de saber que todas as doenças, todos os acidentes, todas as faltas de sorte poderão persegui-los. E - o que é mais importante - terão de enfrentar com serenidade a plena consciência de que são vulneráveis. Este é um dos ingredientes da maturidade: ter serenidade na viagem da vida, mesmo sabendo que tudo pode nos acontecer.


Flávio Gikovate


Marina Lima - Fullgas




26 comentários:

Milene R. F. S. disse...

Amiga que bom que vc gostou do selinho! E só uma observação: vc falou na última postagem que a música caíu certinho com o poema, então, sempre que eu colocar uma música lá, a ouça com o poema, não gosto de ficar dando essa dica sempre, mas sempre há um sentido para a música estar exatamente junto com aquele poema... na postagem do poema anterior por exemplo, a postagem que tinha o quadro de Monet, a música era de Debussy, e tanto Monet quanto Debussy são impressionistas e no poema ( não sei se vc percebeu ) havia várias palavras que remetiam a esse período artístico... a música também nesse caso ( não só por esses motivos, mas pelo próprio som ) na minha opinião também casou certinho com a poesia... Muitas vezes também escrevo os poemas ouvindo as peças que coloco lá... amiga preciso dormir agora, amanhã volto pra ler tuas postagens tá? Beijão!

Caca disse...

Olá, Lena!

Segundo o Rubem Alves (em seu livro E Ai?) esta convivência é tão difícil que nos resta apenas estar sempre ao lado para juntar os cacos.

Para piorar o quadro, Lena o que temos visto hoje é uma demora mais acentuada para as pessoas atingirem uma maturidade. Estamos convivendo com adolescentes de até 30 anos ou mais.

Fantástico o texto do Gikovate. Li um livro dele chamado Vício dos Vícios, sobre a vaidade humana que é uma beleza também.

Abraços. Paz e bem.

Célia Gil disse...

Penso que os adultos terão alguma"culpa" pelo facto de os jovens se considerarem omnipotentes, é que passamos a vida a dizer "O mundo é dos Jovens" aé os convencer disso! Adorei a reflexão, ainda mais porque tenho 2 filhos em plena adolescência! Bjs e bom domingo!

Leninha Brandão disse...

Amiga Lena,também amo Marina Lima e esta sua postagem está perfeita:

Este é um dos ingredientes da maturidade: ter serenidade na viagem da vida, mesmo sabendo que tudo pode nos acontecer.

Flávio Gikovate escreve lindamente e desvenda os labirintos da mente de forma magistral.Parabéns pela escolha.Mandarei por e-mail para um sobrinho que sofreu um acidente.
Bjsssssss,Leninha

Gisa disse...

Período difícil! Tenho três em casa, sei bem.
Um grande bj

mfc disse...

Uma chamada de atenção importante.
Mas como também não liguei aos conselhos que me deram... o que os jovens precisam é de um pouco de sorte para as asneiras que vão cometer!

Penélope disse...

Flávio Giovate é de uma sensibilidade impressionante em seus textos e fala tudo dentro de uma realidade certeira e ao mesmo tempo delicada.
A juventude é a enrgia muitas vezes desperdiçada que só podemos compreender com o passar do tempo.
Muito bela escolha.
Um grande abraço e um FELIZ domingo!!!

Ale disse...

Lena,

As vezes, dá medo... Porque em meio a tantas 'comigo não acontece', pessoas acabam sendo mortas, ou ficam como Vc disse vegetando pro resto da vida, em consequência dos atos, de quem vai levar tempo demais, ou nunca acordem, da atrocidade que estão cometendo, consigo, com a família, e com os demais,

Nossa triste realidade,


Bjos

Sandra Portugal disse...

Amiga querida, passei para te desjar um excelente domingo e agradecer por todo o carinho e apoio que você tem me dado e encontrei esse post tão adequado para o que estamos vendo em todas as mídias sobre a morte de mais um ídolo jovem!!!
Perfeita postagem!
bjs Sandra
http://projetandopessoas.blogspot.com//

AquilesMarchel disse...

ter serenidade na viagem da vida, mesmo sabendo que tudo pode nos acontecer.




....e isso é dificil viu!

Imaculada disse...

Lena querida!
É difícil conscientizá-los de que é preciso serenidade...Só o tempo os ensinarão.
Abraços! Uma semana abençoada pra ti.

Cissa Romeu disse...

OI Lena, tudo bem garota?
Texto muito interessante. Atingir a maturidade não é fácil, e deve vir no momento correto, depois de descobertas tão essenciais... às vezes nos acontece antes ou depois, e também dependem desse campo de experiência.
Beijos e ótimo domingo!

Hellen Caroline disse...

"ter serenidade na viagem da vida, mesmo sabendo que tudo pode nos acontecer. "
Ahh,como é difícil,minha Querida!
mas chegaremos lá ;)
Doce Lena,um domingo de paz pra ti!
te adoro viu?
Beeijo

Unknown disse...

Os jovens adoram desobedecer. Mas, actualmente, não há mais ninguém para lhes dar ordens.

Beijo.

Unknown disse...

E eu aqui tão perto-

Beijo.

Ingrid disse...

Lena,
teus posts sempre levam a reflexão.
muito bom ,pois a vida é assim mesmo..
beijos linda!

Anônimo disse...

Lena querida,
Infelizmente essa onipotência faz parte do ímpeto da juventude. Se acham realmente deuses e as coisas ruins so acontecem aos outros. E quando acontece com alguém do grupo eles refletem por um (curto) período, depois voltam para a impetuosidade novamente e dela só saindo com o amadurecimento, quando se voltam para outras coisas, outras obrigações, outras responsabilidades que os fazem pensar melhor sobre a efemeridade da vida e fragilidade do corpo. Então até lá os jovens contam mesmo e com a proteção divina... Então, resta a nós orarmos por nossos jovens para que Deus os guardem.
Uma beijoka bem doce para você minha doce flor que desabrocha no meu core.
Marly

Anônimo disse...

UN TEMA PARA POLEMIZAR POR MUY BUEN RATO.
UN ABRAZO

Milene R. F. S. disse...

Lena querida, lendo a sua postagem cheguei a conclusão que eu só posso ter sido uma adolescente atípica viu...rs. Eu era muito quieta e introspectiva nessa época, vivia lendo e não me sentia tão poderosa e auto - confiante assim como fala no texto do seu post... na verdade foi um período difícil pra mim, bem diferente do descrito no post... mas entendo observando os adolescentes de hj a minha volta o que esse texto quis dizer... realmente é preciso se cuidar né, e deixar a serenidade guiar a vida... beijão!

Severa Cabral(escritora) disse...

Meu docinho de cõco!
Vc como sempre me colocando no altar,e eu pensando que sou a santa,rrsrsrsrsrsr,
Para sair do medo construiremos uma imagem de perfeição, de criaturas especiais, particularmente abençoados pelos deuses. Resultado: nos sentimos onipotentes e a partir daí não há coisa no mundo que possa nos aterrorizar, uma vez que estamos revestidos de proteções extraordinárias...
Bjs minha linda,que seu domigo tenha sido de paz...
Bjssssssssssssssssss

MA FERREIRA disse...

Leninha.. eu já tinha lido a sua postagem mas não comentado.
Eu como mãe de adolescente entendo bem a mensagem do seu post.
Esta coisa de "tudo posso" é meio complicado.
Li algo hj a respeito.
É confianbça demais. Confiança demais cega. Perde a racionalidade.
A maturidade hoje chega tardiamente.
Em relação aos nossos filhos acredito que nós somos um pouco responsáveis.
Facilitamos muito.
No meu tempo pra se conseguir algo era mais dificl. Hj..ta td muito fácil.
E tb não tinha toda esta "psicologês" que temos hj..

Linda.. adoro ler seus comentários..
Vc escreve super bem.. cada comentário seu, daria uma postagem..

meu brigadeiro confeitado de cristais e diamante... adorei a maneira com que vc descreveu a Meire!!

Bj..linda semana..adoro vc..te admiro..e sinto saudades!!

Ma

Meire Oliveira disse...

Estrelinha amadeirada, acho que o excesso de autoconfiança é tão perigoso quanto a falta dela. Acho que eu sempre tive um medo maior do que minha autoconfiança na fase da adolescência, o que me permitiu não sair muito do meu "quadrado" e passar dos limites. Infelizmente muitos adolescentes acham que são super-heróis e tapam os olhos para suas fraquezas e sua "posição" de mero mortal, acarretando assim acidentes gravíssimos como o texto disse.

"Este é um dos ingredientes da maturidade: ter serenidade na viagem da vida, mesmo sabendo que tudo pode nos acontecer." Porque num adianta nada ficar se descabelando a vida vai nos despentear de qualquer maneira!

Adorei o texto amiga de diamante!!!

"Quero sempre estar contigo, please, segura a minha mão pelas estradas da vida." Seu coração anda de mãozinhas dadas com o meu porque aqui dentro não existe a palavra distância! E é assim que sempre vai ser. Te amo minha cintilante Estrelinha :)

Claudia Caprecci disse...

Tenha uma linda e abençoada semana minha amiga!
Beijos.

Eva disse...

Oi Lena querida, adorei o texto do Gikovate, adolescência é uma fase dificil para pais e filhos, mas de muito crescimento, é o momento de perpetuar a segurança, porque a insegurança do filho trabalha diretamente a segurança do pai, é um momento de desafios e muita disciplina, porque o adolescente está a caça de um modelo e nesse momento firmeza e limites o direcionarão para o melhor dele. bjos grandes. Obrigada pelo teu carinho, andei sumidinha, mas não te esqueço.

Meire Oliveira disse...

Voltei: Eu amooooooooo essa música!!! rsrs :)

Só pra você disse...

Perfeito...

Beijocas